sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Comunismo: morto e enterrado

A onipresença da imagem de Mao está mais para um jogo de cena do que para a realidade, já que as suas idéias comunistas foram soterradas pelo capitalismo ao gosto ocidental na nova China.

O capitalismo venceu a batalha, mas não a guerra. A falta de um inimigo à altura transformou os filmes de James Bond em nada além de ação eletrizante. O charme e o romantismo dos tempos de Sean Connery e Roger Moore perderam espaço para a nulidade de Pierce Brosnan e a virulência de Daniel Craig. George W. Bush, ao contrário de outros presidente americanos da segunda metade do século XX, não teve esse aliado para jogar debaixo do tapete a sua infindável incompetência. O mundo anda tão sem sal que graças à crise financeira mundial está mais do que na moda discutir o futuro do capitalismo e recitar a cartilha do politicamente correto sobre desenvolvimento sustentável e aquecimento global.

Em Pequim, a exemplo de dois outros grandes comunistas -- Vladimir Lenin, na Rússia, e Ho Chi Minh, no Vietnã -- é possível visitar o túmulo com o corpo de Mao Tse-Tung, fundador da República Popular da China e artíficie da revolução cultural chinesa. Na China contemporânea, no entanto, ao contrário de seu fundador, as idéias implantadas pela revolução cultural e o governo comunista estão literalmente enterrados sob canteiros de obras que se extendem por toda uma nova China que floresceu com o dinheiro das grandes corporações. Há cerca de duas décadas, a província de Guangdong, ao sul na fronteira com Hong Kong, não passava de campos de arroz típicos da reacionária economia campesina. Hoje, entre as mais prósperas da China, pouco se vê do passado comunista que saiu de cena para dar lugar a um excesso de hotéis de luxo, restaurantes finos, condomínios de alto padrão e rodovias pedagiadas. Não significa que a antiga China, pobre e reacionária, não esteja ainda lá. Porém hoje ela permanece soterrada sob a inciativa muito bem-sucedida -- por assim dizer -- de atrair o capital estrangeiro.

Não pense, no entanto, que o comunismo na China é apenas uma reminiscência. O excesso de controle do Estado sobre a vida privada -- pelo menos a dos chineses comuns -- permanece mais presente do que nunca. A imprensa local -- mesmo a versada em inglês -- é vítima da supervisão de órgãos do governo e da presença de censores que garantem a boa imagem da república popular, ao menos para os chineses. Há benefícios, evidentemente, como a extenção do transporte público e o acesso dos mais pobres a esse importantíssimo benefício. As taxas anuais de crescimento nas alturas também ajudam o governo a manter a apatia geral do povo, atualmente mais preocupado em conquistar o seu quinhão no paraíso capitalista chinês.

Rival de Hong Kong: A China volta seus olhos para Xangai quando o assunto é modernização. Tecnologia, negócios, moda, hábitos... tudo que sai de lá influencia o resto da nação.

Diante desse cenário, uma pergunta que sempre me vem a cabeça é se o mundo está preparado para a locomitiva chinesa. E mais: a China está preparada para a marcha capitalista? A previsão mais cética dá à China um prazo de dez anos para se tornar a maior entre as superpotências econômicas. Entusiastas, por outro lado, acreditam -- sem muita dificuldade ao vislumbrar que a China fechou 2008 com reservas internacionais de quase US$ 2 trilhões, o dôbro de seu vizinho rico, o Japão -- que o país de Mao deverá chegar à cabine de controle do planeta em no máximo três anos. Viajando pela costa leste chinesa, onde se concentra a riqueza proporcionada pelo desenvolvimento agressivo e desordenado do capitalismo por essas bandas, fica fácil acreditar nas previsões mais otimistas. Xangai e Pequim lideram, sem sombra de dúvidas, a ascensão da China ao alto escalão da economia global. Ambas também são a vitrine do país para o mundo: moda, cultura, esporte, tecnologia, negócios... e tudo o mais que interessar ao ocidente. O mais curioso é descobrir em conversas com expatriados que Pequim antes das Olimpíadas deste ano era um lixo de cidade. Suja e poluída. Hoje, porém, ostenta com certeza o título de uma das cidades mais cosmopolitas e sofisticadas do planeta.

Apesar do susto da crise mundial, a China vai "muito bem, obrigado!" Chineses não têm o mesmo acesso ao consumo que se vê no ocidente. Não desfrutam das benesses do cartão de crédito e nem compartilham (ainda) os mesmos hábitos. Para driblar a crise, que evidentemente também chegou nessa parte do planeta, o governo anda estimulando o consumo. Chineses inundam Hong Kong nesse momento com a bênção do presidente e sua equipe econômica. O visto para a região administrativa especial está mais fácil e barato do que nunca, assim como os descontos, que andam batendo na casa dos 70%, estão mais do que convidativos, obscenos. Já para Macau, que vive do dinheiro da jogatina de seus cassinos de luxo, o governo aplicou restrições de emergência na tentativa de orientar todo o dinheiro possível para o consumo. Ainda assim, a cidade-território anda bombando e de acordo com nossos amigos expatriados que trabalham para os cassinos locais, a demanda está surpreendendo diante das previsões pessimistas.

E assim, o Marxismo-Leninismo, ideolgia para a qual 99% dos chineses (desculpem o exagero) é completamente ignorante, não passa de uma sombra. A não ser pela onipresença de Mao em fotos e cartazes espalhados por prêdios públicos das cidades e lojas de chineses nostálgicos, artigo cada vez mais raro. É curioso ver como a imagem do líder comunista permanece imponente no portão de entrada da Cidade Proibida, na capital Pequim, como se fosse o símbolo de uma disnatia, ironicamente o sistema político contra o qual Mao Tse-Tung dedicou sua vida para derrubar.

Leia também:
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Façam suas apostas
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1 Comentários:

Blogger M. Alice Bragança disse...

Olá, Renata, querida!
Uma delícia o blog. Bons textos e bem lindo, bem planejado. Bj : )

19 de janeiro de 2009 às 12:26  

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